passarola quer voar: 19. Uma visita guiada por Velhos Sábios, parte II

sexta-feira, maio 16

19. Uma visita guiada por Velhos Sábios, parte II

E cá está a continuação do episódio da semana passada... :)

- E como é que conseguem trazer tantas coisas tão grandes? – Não se conteve a Carlota ao ver os restos de um piano de cauda num canto daquele espaço.

- Um grupo de lagartos organiza a travessia do objecto durante a noite, num carro puxado com cordas, como o que viu com o quadro de sua mãe. Empurra o objecto para um dos milhares de buracos que construímos, iguais àquele onde a menina caiu e depois, os nossos lagartos autorizados fazem a recolha e transporte até aqui.

Enquanto o Lagarto emproado falava, a Carlota acenava com a cabeça para esconder a enorme confusão que tanta informação e novidade estava a criar no seu cérebro.

- Depois, definimos a função de cada um destes objectos e preparamo-los devidamente para que cheguem à respectiva oficina já prontos a serem reutilizados. – Carlota girou a cabeça para conhecer a voz do lagarto dos tecidos coloridos que empurrara o ténis do novo amigo do seu pé.

Avançaram todos para outra redoma, ligeiramente mais pequena, amarela, com um cheiro doce. Mais de metade do seu espaço era ocupado por um gigantesco cilindro de vidro azul. Lá dentro, voavam milhares de insectos de todos os tipos que ela conhecia e não conhecia. O bzzzzzz das suas asas era mais uma vez abafado pelo vidro.

- Neste espaço, criamos alimentos para distribuir por zonas carenciadas ou lagartos que não tenham a possibilidade, ou idade, para subir à superfície. – Voltou a falar o lagarto vestido, enquanto já avançava para uma redoma de vidro escuro, opaco. – E ali fica a nossa fábrica de viaturas.

- Para facilitar este trabalho estudámos o vosso sistema de transportes e desenvolvemos os nossos próprios veículos - Enquanto falava, o Lagarto da voz tremida apontava com a cauda para um conjunto divertido de carros que se encontrava estacionado num grande garrafão de plástico, arrumado a um canto da oficina. Alguns deles eram tão estranhos que a Carlota não conseguiu identificar os materiais com que tinham sido feitos mas distinguiu facilmente uma lata de atum, um teclado antigo de um computador e um camião de brincar de bebé. Todos eles tinham sido transformados e estavam agora ligados a bases feitas de metal que podiam esconder pequenos motores. No entanto, nenhuma das viaturas apresentava rodas, pneus ou qualquer objecto redondo por baixo da base.

- Como é que se deslocam? – Perguntou, enquanto o lagarto do dedal, novamente acordado, tentava entrar para dentro da sandália, acomodando-se de barriga para o ar, entre o peito do pé dela e a fivela que o prendia..

- Utilizamos o motor para accionar um evoluído sistema de locomoção a vapor – explicou a voz menos conhecida do menos emproado dos dois das fitas coloridas, enquanto, com a cauda, apontava para uns veículos que naquele momento atravessavam o ar do lindíssimo jardim das redomas.

A Carlota virou-se ao contrário e aproximou os olhos de uns tubos de vidro transparente que faziam curvas e contracurvas, por entre as muitas redomas coloridas, ao nível dos seus ombros. A imagem era lindíssima! Infinitos oitos transparentes percorriam o espaço, correndo em todas as direcções, furando as paredes de rocha por túneis pouco maiores que o tamanho da sua cabeça. No seu interior circulavam veículos nos dois sentidos sem tocar o vidro. Um espesso vapor quente saía por buracos que furavam as bases metálicas das viaturas e que as mantinha em suspenso, avançando no ar.

- Os nossos motores trabalham maioritariamente com energias naturais mas ainda necessitam de petróleo refinado para o seu perfeito funcionamento – continuou a explicação o mais emproado.

- E é por isso que mantemos aqui perto, uma reserva de petróleo que foi recentemente descoberta durante a construção da casa do cão – Concluiu num tom grave o Sábio dos Sábios.

- Da casa dos teus amigos – especificou o Jeremias – e é aqui que tu nos podes ajudar.

Dentro da cabeça da Carlota começaram a acender-se milhares de luzinhas em simultâneo e ela finalmente começou a juntar todas as peças daquele puzzle tão misterioso com que andava a cismar desde o início das férias.

- Então o vosso petróleo é que é o meu tesouro – percebeu a Carlota, satisfeita com a resolução de mais um mistério. - Foi isso que a Vera e o Tomás descobriram durante as obras e é disso que não querem falar.
- Os seus amigos são muito sábios – afirmou o Sábio dos Sábios – São conhecedores das desgraças e tragédias que uma informação dessas pode trazer a quem não a souber usar.
- Mas o que é que vocês acham que eles vão fazer com isso?
- Talvez voltem a tentar furar o mesmo local. Por isso já mudámos a nossa reserva para outra zona. Mas o problema é que há outro humano que também possui essa informação e esse, anda a furar terrenos um pouco por todo o lado, em busca de petróleo.

A Carlota pensou mais um bocadinho e acabou por se lembrar – Ahhh…o Simão, o construtor que não os larga…
- Com as suas escavações, esse homem tem posto por diversas vezes em perigo o nosso segredo. Ao tentar furar mais fundo, tememos que se aproxime perigosamente de descobrir este espaço, fundamental para a nossa sobrevivência.

A Carlota sentiu-se sinceramente preocupada com a possível destruição de um espaço tão perfeito. – E o que é que eu posso fazer para vos ajudar?
- É preciso que a Vera e o Tomás voltem a furar para que não encontrem nada e é preciso que o Simão saiba disso - A Carlota deliciou-se com o pensamento de que o Jeremias também era um verdadeiro detective. – Tu conhece-los, vais encontrar uma solução. Tenho a certeza disso.
- Bolas! Não sei se consigo – desabafou a Carlota ao sentir o peso da responsabilidade.
- Eu vou continuar a ajudar-te – disse o Jeremias enquanto um lagarto agitado entrava com uma mensagem que o Sábio dos Sábios transmitiu à Carlota .
- Está na hora de voltar para o buraco 35. Os humanos estão naquela zona à sua procura.
...

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